Projeto de lei altera o SNUC para possibilitar a abertura de estradas em unidades de conservação

13 de agosto de 2021

Ao criar no Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza a categoria de “Estrada-parque”, a Iniciativa pretende reabrir a Estrada do Colono no Parque Nacional do Iguaçu

Trecho da Estrada do Colono, já coberto pela mata. Foto: Marcos Labanca/Rede Pró UC

Está tramitando em regime de urgência na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 984/2019, do Deputado Federal Nelsi Conguetto Maria, o Vermelho (PSD/PR), que altera a Lei nº 9.985/2000 para criar a categoria de Unidade de Conservação denominada Estrada-Parque e institui a Estrada-Parque Caminho do Colono no Parque Nacional do Iguaçu.

O Parque Nacional do Iguaçu é uma Unidade de Conservação de Proteção Integral (UC), criada pelo Decreto 1.035/1939 para proteger as Cataratas do Iguaçu e a biodiversidade local. A Estrada do Colono foi aberta nos anos 1950, cortando a floresta no meio do parque. Foi fechada por decisão judicial em 1986, e desde então surgiram várias tentativas de reabri-la.

O projeto implica na derrubada de mais de 200 hectares de Mata Atlântica, abrindo quase 18 quilômetros de extensão por seis metros de largura no meio da floresta em regeneração. O Biólogo Paulo Pizzi (CRBio 8.082/07-D), presidente do Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais e conselheiro do Conselho Regional de Biologia da 7ª Região – CRBio-07, ressalta que o artigo 11 da Lei da Mata Atlântica (Lei 11.428/2006) veda o corte e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração do Bioma Mata Atlântica, nas características apresentadas neste local da unidade de conservação.

A justificativa para a abertura da estrada é que ela integraria e restauraria as relações socioeconômicas e turísticas nas regiões oeste e sudoeste do Paraná, o que não se sustenta: “A paisagem que se via na extinta estrada era apenas de árvores por ambos os lados. É uma paisagem que pode ser vista facilmente pela borda do parque, sem necessidade de destruição da mata”, argumenta Paulo Pizzi.

SOCIEDADE CIVIL SE MANIFESTA CONTRA REABERTURA

Organizações da sociedade civil estão se mobilizando contra a reabertura da Estrada do Colono. Mais de 300 instituições e lideranças assinaram uma nota enviada aos líderes das bancadas da Câmara dos Deputados, na qual repudiam a aprovação do requerimento de urgência para votação do PL 984 e ressaltam os pontos nocivos do projeto: caça e tráfico de animais, inclusive de espécies ameaçadas de extinção; transporte internacional de drogas, armas e mercadorias ilícitas; prejuízos ao turismo e ao desenvolvimento econômico do oeste do Paraná; desmatamento da Mata Atlântica; construção de estradas em áreas protegidas facilitando a ocorrência de incêndios florestais e a bioinvasão. 

Em carta encaminhada ao presidente da Câmara, Arthur Lira, organizações da Argentina afirmam que a Estrada do Colono é uma “ameaça que afeta de forma incalculável não só a raríssima biodiversidade do local, como a última população de onças-pintadas do sul do Brasil, também ameaçando indiretamente as populações argentinas e paraguaias do felino, além de fragmentar o maior remanescente contínuo de Mata Atlântica de Interior”.

A bancada ambientalista do Conselho Estadual de Meio Ambiente de São Paulo – Consema aprovou moção de repúdio contra o projeto de lei. “O projeto é um enorme retrocesso em especial no Paraná que nos anos 1890 tinha mais de 90% de cobertura florestal de Mata Atlântica e hoje restam menos de 7% da antiga formação original. Mais do que isso, a criação da nova categoria de Estrada Parque abre um perigoso precedente de agressão ao meio ambiente para os demais estados da federação”, diz o manifesto. O documento foi encaminhado aos presidentes da Câmara e do Senado e às lideranças dos partidos no Congresso. 

O Sindicato dos Médicos Veterinários no Estado do Paraná – Sindivet-PR publicou um parecer sobre o PL 987/2019, ressaltando que “considera fundamental a retirada do Projeto, levando em consideração o mérito da questão ambiental em relação à saúde pública e sobrevivência de espécies. Inclusive a humana”.

Da mesma forma, o Conselho Regional de Biologia da 7ª Região – CRBio-07 manifesta grande preocupação sobre os impactos que a eventual aprovação do PL e a construção de “estradas-parque” venha a causar sobre a biodiversidade resguardada pelas unidades de conservação brasileiras.