O Conselho Federal de Biologia (CFBio) manifesta sua indignação com a inércia da iniciativa privada e do poder público diante do rompimento de barragem de rejeitos do processamento de minério de ferro no município de Mariana, em Minas Gerais. Pelo menos oito pessoas morreram e outras 11 ainda estão desaparecidas com a passagem do “tsunami de lama” proveniente da barragem. O incidente destruiu casas e escolas, deixou centenas de desabrigados e devastou a biodiversidade da Bacia do Rio Doce.
Diante da maior tragédia ambiental da história do País, o CFBio tem entrado em contato com Biólogos das regiões afetadas, mobilizando-se para mapear a amplitude socioeconômica ambiental do desastre.
O Conselho Federal apoia e se irmana ainda à Sociedade Botânica do Brasil (SBB), que se manifestou em nota (confira abaixo) sobre a tragédia em Mariana. A falta de um plano de contingência adequado é apontada como um dos agravantes da tragédia, que pegou completamente desprevenida a população do distrito de Bento Rodrigues.
A barragem de Fundão, de propriedade da empresa Samarco, rompeu no dia 5 de novembro de 2015. Cerca de 40 bilhões de litros de lama com rejeitos de minério se alastraram pelo Rio Doce, atingindo o mar no litoral do Espírito Santo.
A Samarco é controlada, em sociedade igualitária, pela mineradora anglo-australiana BHP Billiton e a brasileira Vale, também responsáveis pela tragédia. A Vale mantinha, inclusive, contrato para utilizar a barragem de Fundão, onde despejava seus próprios rejeitos.
As causas da catástrofe estão sendo investigadas pelo Ministério Público. A Polícia Civil e a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável também devem investigar o caso.
Leia abaixo, na íntegra, a nota da Sociedade Botânica do Brasil, avalizada pela diretoria do Conselho Federal de Biologia.
NOTA SOBRE O MAIOR DESASTRE AMBIENTAL DO BRASIL
Diretoria da Sociedade Botânica do Brasil
Na tarde do dia 5 de novembro de 2015 teve início o maior desastre ambiental da história de nosso país, quando 62 milhões de metros cúbicos de rejeitos do processamento de minério de ferro escaparam pelo rompimento de duas barragens do Complexo de Germano, nos municípios de Mariana e Ouro Preto, na Bacia do Rio Doce, em Minas Gerais. O cenário é desolador e as causas e consequências do evento para a saúde da população e para o meio ambiente estão sendo investigadas pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).
O imenso volume de rejeitos matou pessoas, soterrou suas casas, escolas e igrejas. Matou animais e plantas e mutilou a biodiversidade da Bacia do Rio Doce, uma das mais importantes bacias hidrográficas da América do Sul, com áreas nos estados de Minas Gerais e do Espírito Santo. Matas de Galeria, peixes, tartarugas, sapos, pererecas e os habitats onde viviam foram severamente afetados ou simplesmente dizimados. A retomada da caminhada pela vida das pessoas que perderam familiares, vizinhos e amigos além de todos os seus pertences, será sofrida, doída. As primeiras vítimas foram os moradores de Bento Rodrigues, distrito de Mariana, mas os danos ambientais perdurarão por um longo período de tempo. Os danos ao Rio Doce e às colônias e comunidades ribeirinhas ainda terão que ser avaliados, incluindo a possibilidade de ter ocorrido extinção de espécies de microrganismos, animais e plantas, um prejuízo inestimável à biodiversidade.
No momento do incidente, a empresa Samarco, proprietária das barragens, foi incapaz de acionar um plano mínimo de contingências exigido pela legislação ambiental brasileira. Sirenes não foram acionadas e as pessoas das comunidades diretamente atingidas foram contatadas por telefonemas da Samarco, de amigos ou parentes. A diretora da escola da comunidade foi avisada pelo marido que conseguiu chegar ao local a tempo de auxiliar a retirada das crianças, que escaparam da avalanche de lama que se aproximava. A empresa ou qualquer órgão do estado nunca promoveram treinamento à população para eventualidades, incidentes ou acidentes oriundos das barragens. É preciso esclarecer que a Samarco é uma sociedade das duas maiores mineradoras do mundo, a BHP Billiton (empresa anglo-australiana) e a Vale, na proporção de 50%-50%, e que por controlarem a Samarco também são responsáveis pelo desastre.
As cidades de Governador Valadares e Colatina, só para citarmos as mais populosas, foram desabastecidas de água. Escolas e universidades interromperam as suas aulas e a atividade econômica foi prejudicada. Hospitais, asilos e órgãos públicos tiveram o funcionamento comprometido. As vilas e comunidades de pescadores estão sem meios de sobrevivência. As consequências ambientais podem impor mais perdas de vidas humanas, possivelmente muito mais do que as que foram diretamente perdidas na avalanche de lama. Uma terceira barragem (Germano, município de Mariana) terá sua estrutura reforçada por ter atingido a sua capacidade máxima, proporcionando perigo às populações vizinhas, que foram retiradas do local por medida de segurança.
As autoridades e os técnicos responsáveis sejam federais, estaduais ou municipais, se mostraram atônitos, tímidos, talvez pela incapacidade para agir em situações de tamanha envergadura. Ministérios e secretarias de meio ambiente, de minas e energia se intimidaram com a gravidade do desastre.
Passado o primeiro impacto e tristeza, a Sociedade Botânica do Brasil (SBB) vem expressar a sua indignação com a paralisia da iniciativa privada e do poder público frente ao imenso desastre que ceifou vidas humanas e causou imensos danos à biodiversidade.
A SBB espera que:
* as autoridades divulguem quais serão as suas ações para responsabilização, prevenção, mitigação, reparação e indenização desse e de outros desastres causados por atividades de mineração;
* o Ministério Público apure os fatos e apresente ações simétricas e compatíveis com a envergadura do desastre;
* que o Congresso Nacional ao analisar o Projeto de Lei nº 5.807, de 2013, que cria um novo Código da Mineração, seja prudente e leve em consideração os prejuízos e as consequências da tragédia de Marina para a saúde da população e para o meio ambiente.
A Sociedade Botânica do Brasil buscará discutir em um simpósio, atividades e ações para prevenção e mitigação de danos e impactos, bem como restauração ecológica, causados pelas atividades de mineração. Tais atividades nortearão a elaboração de textos, cartas, moções dentre outros documentos sobre o tema. Esse simpósio poderá ocorrer no Congresso Nacional de Botânica a ser realizado em 2016, na cidade de Vitória, Espírito Santo. A Sociedade Botânica do Brasil também buscará em articulação com outras sociedades científicas apresentar os resultados e de outras ações à sociedade.
Viçosa, 17 de novembro de 2015
Prof. Dra. Renata Maria Strozi Alves Meira
Presidente da Sociedade Botânica do Brasil – SBB
Fonte: CFBio